domingo, 27 de setembro de 2009

hoje fui no Santa Marta...

... primeira vez que subo numa favela, antes passava só perto ou ia só na entrada. Já malhei ali num dos acessos do Salgueiro, aqui perto de casa, estudei perto do Borel e passo no meio de uma quando vou para Camboinhas, em Niterói. Conhecia o Dona Santa Marta de passar por perto, as vezes numa coletiva de imprensa com o prefeito ou governador, ali no Palacio Guanabara, da Cidade, não lembro, acho que é o da Cidade, que era a embaixada inglesa e foi comprada pela cidade (o municipio tem prioridade de compra de certos imóveis que estão em terreno municipal). Numa dessas coletivas anunciaram a pacificação do Santa Marta, disseram que não é mais Dona Marta, explicando que o nome do morro é por causa da imagem da santa que fica no alto dele, não por causa de uma suposta famosa senhora.

Foi por causa dessa pacificação que fiquei tranquilo de arriscar chegar lá em cima, curioso pra ver as rampas desse Desafio no Morro Red Bull, em que uns malucos de bicicleta competiram pra ver quem descia as ladeiras da favela comunidade mais rápido. Peguei as minhas coisas, a mochila de figurinos da minha menina que tinha deixado aqui em casa (pesava uns 6/7kgs ou mais) pra entregar na casa dela na volta. Saí do 410 ali na entrada do morro, naquela pracinha onde tem feira uns dias da semana e comi um pastel nojentão certa vez. Fui subindo e vi umas casinhas bem ajeitadas, uns moleques correndo na rua e umas bancas/quiosques vendendo cerveja e salgado, parecendo aquelas de Botafogo, perto da Voluntários, ali do lado do Cinema Estação. Acho que o chão era todo de paralelepípedo. Cheguei e tinha duas bifurcações, uma pra esquerda, com um quiosque/banca vendendo cerveja e fazendo churrasco, com um caminhão no caminho, na ladeira e o da direita, com um bar e uma escadaria e uns moleques correndo. Tinha gente por todo o lado, música alta e sotaque nordestino por todo canto. Pedi orientação ali na esquerda prum cara de um barzinho, que disse que era a direita, subi por onde ele disse até me disserem que tava no caminho errado.
- Onde é que tá esse desafio Red Bull?
- Já acabou...
- Eu sei, quero só ver as rampas...
- Tem que ir ali pela direita, só subir a escadaria.
- Beleza, valeu!

Um moleque de camisa vermelha e óculos escuros me explicou que eu podia pegar o bondinho/elevador inclinado e sair na quinta estação ou podia ir pelas escadas. Fui pelas escadas, claro. Queria conhecer o lugar. Fui subindo e me espantei com a quantidade de gente por metro quadrado, nas escadas, nas pracinhas, fazendo churrasco, ouvindo pagode, tomando cerveja, em todo o canto. Todo lugar tinha pessoa fazendo alguma coisa. Foi uma boa primeira impressão. Subi mais um pouco e encontrei uma pracinha com uma show evangélico, falavam sobre Jesus, recebi uma filipeta de papel e subi direto na hora que o bateirista começava a puxar a música.

As vielas são muito estreitas, muitas vezes tem que se passar entre duas pessoas conversando ou literalmente na porta da casa de alguém. O chão tá sempre sujo e o riacho que corre tinha cheiro de esgoto. As casas são construídas muitas vezes em cima desse riacho, que já foi limpo um dia, talvez mais pra cima ainda seja. Mais bares, à direita e a esquerda. Com televisão sintonizando o jogo do Flamengo, com senhores comendo em marmitas em cima de mesas de sinuca ou só vazios, sem nem dono nenhum.

Mais escadas e a mochila começava a pesar, um cachorro bonito deitava no meio do caminho e uns moleques faziam churrasco e falavam merda. O cachorro abre os olhos, me vê e volta a dormir. Passo entre ele e os garotos e vou subindo, umas garotas tomam Sol (nesse horário não tem mais Sol forte, acho que nem tem mais Sol, porque o morro tampa) numa pedra. Uma menina desce a escada de concreto e a irmã mais nova, enrolada na toalha desce atrás dela fazendo uma pergunta. É um ponto do Morro que só é caminho, porque não dá pra construir casa. Mais acima canso e sento num banco de concreto, numa mesa que devem beber cerveja e jogar baralho. Olho o Rio de Janeiro e percebo o quão alto eu fui. Botafogo tá lá embaixo, dá pra ver algumas palmeiras e os prédios e um pouco da Lagoa. O Sol tá batendo bonito em alguns prédios enquanto o Dona Marta tá numa brisa fresca. Levanto e recomeço a subida

Aqui já tem menos nordestino e mais negro, subo umas escadas e paro em frente uma igreja que tá uma menina falando "o que o Red Bull não faz, hein?". Perdido paro e pergunto pra onde devo ir e o pastor me fala a direção, que é só ir em frente, virar a direita subir. Vou em frente, à direita tá o Rio, à esquerda a favela, e um moleque brinca com um portão. Vou passando por rampas por todo o caminho. No começo não as vi, agora já vejo melhor, colocadas entre escadas e as pedras, escadas e as casas e as vezes os caras desciam só por escadas mesmo. Tinha tufos quadrados de palha orientando o caminho do percurso. Vou subindo. Me perco de novo. Volta e meia me perdia, parava e perguntava: Onde é que tão as rampas do Red Bull? Aí me orientavam. Uma hora me deparei com um viado com compras na mão que tava seguindo o mesmo caminho e me orientou até certo ponto, onde chegou a casa dele, que tava a irmã ou uma menina esperando. "Você quer que eu seja seu guia turístico?", perguntou. Que isso, não precisa, e fui subindo, mas me perdi logo depois, porque ele disse que era pra subir, virar a direita e chegar numa hora que só podia virar a esquerda, mas durante todo o caminho podia virar a esquerda, mas ia cair na casa das pessoas. Era beem mais a frente do que ele/ela tinha dito. Quando tava quase perto encontrei o cara de óculos e camisa vermelha do começo do percurso. "Me segue que eu te deixo na metade do caminho". Se a favela não fosse pacificada, se é que ela é mesmo porque não vi um policial o tempo todo, eu ia estar me cagando de medo a essa hora, com medo que caísse na boca de um traficante ou algum lugar obscuro. Comecei a pensar que foi bobeira ter levado a mochila com os figurinos, além de estar pesada pra caralho aquela hora, podiam roubar ou sei lá. Não conhecia ninguém ali. Imaginava em outros lugares, que nego podia dar sumiço a qualquer um podia. Mas fui confiando e subindo, o cara falava com uns caras no caminho sem parar, uma senhora pediu algo a ele, que respondeu alguma coisa e continuou subindo. Achei que ele era meio maluco (não de psicótico ou alguma coisa, mas que ali, no morro, consideravam ele maluco). Havia um bar, que até serviu de caminho pras bicicletas bem em frente a uma escada, com uns caras bebendo. Um me cumprimentou e cumprimentei de volta. Ele falou algumas coisas e continuou e eu atrás.

Mais a frente ele se despediu e me explicou que era só segui as linhas de energia do poste que eu chegava lá. Subindo encontrei uns moleques de azul, de uma igreja. Um deles me ofereceu uma filipeta e me disse pra ir no culto do pastor tal. Agradeci e um moleque mais acima fez a mesma coisa. Volta e meia tinha uma galera de azul falando com as pessoas. Uma hora lá, parei de novo pra descansar e vi de novo o Rio, agora mais alto e mais bonito, dessa vez dava pra ver a praia.

Cheguei lá em cima, no começo do percurso, que tinha uma rampa que saia do telhado da Igreja (devia ser a Igreja Santa Marta). Uns moleques tentavam escorregar na rampa, mas eram escorraçados por um olheiro. Aí cheguei na parte que queria contar, que fez valer toda a canseira. Subi um pouco da ladeira e fui pra cima de uma laje. Sentei do lado de um caixa d'agua e fiquei vendo o Rio. A frente, à esquerda, eu via o cemitério São João Batista e a rua que dava na entrada dele, aquela rua do Teatro Poeira. Depois, tinha a praia, acho que de Copacabana, entre dois morros. No morro da direita tinha alguns prédios iguais, pareciam unidades habitacionais e o Sol batia diretamente neles e era muito bonito. À frente e a esquerda, a Lagoa, iluminada pelo Sol e mais a frente, os prédios e a praia de Ipanema. Devia ser demais a vista quando não tinha prédios. À minha direita, o Cristo com os braços abertos. Atrás, a igreja e alguns barracos e a vegetação ainda intocada do morro. Batia uma brisa fresca em contraste com o Sol de 15/16h do Rio. Imaginei fazendo Yoga ali haha, deve ser demais e good vibe pra caralho.

Uns moleques soltavam pipa, um cara tentava botar o rádio pra funcionar e o olheiro mandava os moleques pararem de descer na rampa. Vi as roupas do pessoal secando no varal, tinha uma camisa da Comlurb, e imaginei os bandidos correndo por aquelas vielas, saltando ali das lajes, fugindo de tiro, correndo risco de torcer o pé e ficar a mercê de tomar bala. Os caras eram bem ninjas. Podiam pular e pisar num prego e pegar tétano, uma das madeiras dessas casas podiam quebrar e os caras cairem, o telhado podia quebrar... Tinha umas casas bem ajeitadas, outras de madeira, outras de zinco, umas com parede de cortiça, molhadas e caindo aos pedaços. No caminho vi uma casa incendiada, só sobrando o esqueleto e as fundações pra suportar a casa em cima da pedra. Outras casas eram de concreto e não pareciam que tinha esse risco. O contraste dentro da favela parece ser enorme. As pessoas parecem não ter privacidade, é muito barraco junto, se o vizinho liga o rádio, o outro ouve tudo. Imagino Nelson Rodrigues vivendo hoje, as crônicas e peças que ele escreveria sobre as favelas, essa proximidade urbana toda, os possíveis conflitos, aquela tensão que ele sabe descrever bem. As favelas são um prato cheio pra isso. Lembrei que no caminho da subida passei por um velho falando do campeonato do Red Bull (prato cheio pra publicitário, gerou bafafá pra caralho e entendi o conceito de google adsenses, que capitaliza em cima de palavras chave, que é o que a publicidade corre atrás: espalhar palavras-chave) e uns moleques sacaneavam/falavam do alto de uma laje com ele, que tinha vitiligo: fala aí, malhado, como vai, malhado, tá fazendo o que, malhado. E o velho respondia, nem sei se ficava ofendido.

Aí a pipa caiu na laje na minha frente, uns moleques foram pegar e o pai do garoto dono da pipa começou a falar com eles que a pipa tinha dono. Um mais crescido pegou a pipa, não sei se ia ficar com ele ou devolver, mas ficou naquelas e começou a ajeitar pra devolver e os moleques que iam pegar a ajudar dele. Aí veio um cara do alto da igreja, do lado do que tava guardando as rampas e começou a gritar com geral pra descer, até comigo. "Tá fazendo o que aí?". Só vim ver a rampa. "Tá vendo a rampa como de costas?". Cansei daquilo e resolvi descer, já tinha perdido o meu sossego. A descida foi bem mais rápida. Muito mais rápida e nem precisei de orientação.

No caminho mais caras de azul, conversando com senhoras. Uma reclamava de dor no braço a outra sei lá. Um cara de azul orientava ela a se cuidar. Mais a frente moleque falava com outro pra ir procurar a Igreja Universal dali. "Você sabe onde fica, né?". Logo depois passo por ela. Se eu fosse um desses moleques eu tava fodido. Talvez ficasse o tempo todo em casa, não socializasse com ninguém. Desço pelos portões, pelos churrascos, pelos bares, pelos cachorros no meio do caminho, pelas rampas nas beiradas, entre meninas discutindo algo, pelo show evangélico no meio do caminho (acabei descendo por um caminho diferente do que subi), pelos bares/quiosques, pelo caminhão da produção que tava indo embora, até chegar na praça. De lá, parto pra Lapa, pra entregar a mochila pra minha garota.

* veja as fotos do evento.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

retomando...

Parei com a Yoga pela enésima vez faz uns dois meses, por falta de grana dessa vez. Grana nada, vontade mesmo de acordar cedo e porque eu não fazia a série de exercícios regularmente em casa como deveria. Fazer a série uma vez só por semana e achar que tá tudo ok, não rola né? Tem que ter assiduidade. Hoje cancelei a natação porque não andava frequentando e não queria pagar pelo que eu não estava usando (mês que vem eu volto a nadar e reabro a matrícula sem pagar taxa). A natação eu não andava frequentando por perda de pique (nas férias, em agosto, tive desejo absurdo de não fazer porra nenhuma) e porque tive uma infecção no ouvido direito, que me forçou a evitar as piscinas.

Mês que vem eu volto para as duas, eu acho... O que me falta, o que sempre faltou foi disciplina para levar algo até o fim. Perco o interesse rápido e logo parto para outra, acho que o que me prende é o resultado a curto prazo e a excitação inicial. Venho tentando frequentar a Yoga há 11 anos (desde os meus 15 anos) sem sucesso. Se antes era porque dependia da vontade financeira dos meus pais, agora é porque o parco salário de estagiário não é o bastante para financiar uma vida saudável, de esbórnia e namoradeira ao mesmo tempo.

Mas isso é uma maneira de encarar as coisas. Talvez quando adolescente o que digo que era interesse genuíno pela Yoga fosse só uma curiosidade adolescente. Nessas minhas indas e vindas durante todos esses anos é que fui descobrindo que ela realmente ajuda em algumas coisas, me soltando e acabando com alguns nós musculares (e mentais) no meu corpo. Talvez eu só esteja estudando como entrar de cabeça nesse troço.

Assim como os blogs, aliás... matei o meu antigo endereço, de novo, e voltei com esse daqui. Vivo em uma eterna retomada de blogs. Mas dessa vez, tenho motivo de ter matado o antigo endereço. Agora vamos ver se consigo levar esse aqui adiante...